Diminuição da maioridade penal:
a responsabilidade dos prefeitos

A retomada da discussão no Senado sobre diminuição da maioridade penal, de 18 para 16 anos, é um sinal claro da ineficácia de políticas municipais voltadas para o atendimento de adolescentes envolvidos com ato infracional. Sob responsabilidade da Assistência Social dos municípios, esses programas têm poucos recursos, falta de pessoal e costumam figurar nos últimos lugares das prioridades políticas locais. A culpa é dos prefeitos.
Cabe à Assistência Social do município (por meio do Centro de Referência Especializado da Assistência Social - CREAS) o atendimento de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto (liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade), ou seja, os casos de adolescentes que se envolveram com atos infracionais de menor gravidade e receberam medidas que não implicam privação de liberdade.
As medidas em meio aberto poderiam funcionar como espaço e momento de modificação da trajetória de um adolescente, por meio de um atendimento integral (como preconiza o ECA) que envolvesse também a família, com diagnóstico familiar e atendimentos capazes de dar conta das especificidades de cada caso, com a garantia real dos direitos e do acesso às políticas sociais básicas. Isso poderia de fato dar a oportunidade para os adolescentes reorientarem suas trajetórias e não caírem nas mãos de organizações criminosas como “mão de obra” barata e descartável ou na continuidade de atos infracionais que os levem para a privação de liberdade.
Além disso, a estruturação do serviço de convivência e fortalecimento de vínculos da Assistência Social, juntamente com outras políticas públicas (em especial escola em tempo integral), deveria priorizar as áreas de maior vulnerabilidade. É o aspecto preventivo.
No entanto, em geral, nada disso acontece. Os programas ficam “travados”, na maioria dos casos, na simples realização de atividades de baixo interesse para os adolescentes ou em ações sem capacidade de, por si só, causar modificações reais na vida dos atendidos (como artesanato, em muitos casos capoeira), além de sessões de atendimento psicológico. Há vários CREAS que funcionam com apenas um ou dois assistentes sociais que se responsabilizam, além dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, por todos os outros casos de competência do CREAS, como violência e abuso, idosos, população de rua.
Na educação (e aí entra também a rede estadual), as escolas não têm apoio técnico nem profissionais preparados para atender os adolescentes que, durante o cumprimento da medida socioeducativa, estão matriculados. Com isso, em vez de educar, realimenta o ciclo de exclusão e preconceito. Na área de saúde, grande parte dos municípios não dispõe de atendimento especializado para tratamento de usuários de substancias psicoativas (drogas), hoje uma das razões mais frequentes para o envolvimento com ato infracional.
É preciso assim colocar em pauta a responsabilidade municipal: qual é o investimento em medidas socioeducativas em meio aberto? Como funcionam esses programas? Como está sendo realizada a integração entre as diversas políticas públicas para atender com prioridade absoluta esses adolescentes? O que acontece com os adolescentes depois que cumpriram as medidas? Qual o percentual de reincidência?
A questão não é de maioridade penal, é de responsabilidade da política pública, a começar pela responsabilidade municipal.

Elvis Cesar Bonassa
Doutor em Filosofia pela USP e diretor da Kairós Desenvolvimento Social